29.9.01


Lazer: o perfil de João Ubaldo Ribeiro escrito por Wilson Coutinho para a coleção Perfis do Rio (Relume-Dumará). João é leitor do Lanceiro Livros, que agradece penhorado a companhia. Mas estou em dívida contigo, João: ainda não li Viva o Povo Brasileiro, falha imperdoável no currículo. Mas está na lista pra breve!


"Se vai viajar, carregue pouca bagagem", conselho do filósofo Wittgenstein aos jovens, que como tudo que ele disse e escreveu deve ser interpretado de várias maneiras. Uma das epígrafes ao longo do perfil de João. Puxa, Wilson, Wittgenstein é muito complicado (e esta frase também deve ser interpretada de várias maneiras)!

28.9.01

Os bons e novos tempos


Os Contos do Fim do Mundo
Mário Melillo
AP & MM
118 páginas

Hamlet e Macbeth nasceram em Muriaé
Remo Mannarino
Alpha Centauri
201 páginas



Dois autores independentes com uma grande diferença de idade e de estilo mas algo em comum: o bom humor. Em suas estréias na ficção, o mineiro Mário Melillo e o carioca Remo Mannarino dão a cara a tapa e saem sem um arranhão, com livros que falam de amor e morte, mas sem perder a esperança e o jogo de cintura.

Em Os contos do fim do mundo, Melillo viaja entre a crônica de costumes e o delírio psicodélico, sempre com um olho crítico sobre a realidade. Melillo morou em Londres e Miami, e não é por outro motivo que em várias de suas histórias desfilam ingleses de chapéu-coco e chicano-americanos, quase todos funcionários medíocres ou aristocratas falidos, que não faltam nem no Reino Unido nem nas Minas Gerais. Outro traço comum da maioria das narrativas é o excessivo rigor da forma: seja em A Confissão Fracassada, onde um milionário venezuelano tenta se redimir com sua mulher na hora da morte, ou no conjunto de contos que formam a parte três do livro, Dos amores mortos, em que o moribundo bon-vivant Betinho Boaventura relembra os amores que se foram e o dinheiro que acabou, as narrativas são rígidas, quase engessadas... como os personagens, de quem Melillo não tem pena: ora os ridiculariza, ora simplesmente os aniquila. Mas eles não saem indiferentes. Nem você, leitor.

Mas o destaque absoluto do primeiro livro deste itabirense (não itabirano, como Drummond, mas de Itabirito, cidade vizinha a Ouro Preto) de 35 anos vai para Os anos 70 eram uma festa, em que ele rompe inteiramente com o próprio machadismo e faz uma bela homenagem a José Agrippino de Paula e seu recém-relançado Panamérica. Só este conto vale o livro.

Já Remo Mannarino não é iniciante: autor de Introdução à engenharia econômica (Campus, 1991), ele se joga de cabeça sem rede de proteção no mundo da literatura independente com Hamlet e Macbeth nasceram em Muriaé. Em uma sucessão de contos ora bizarros ora sérios, este carioca de 63 anos mostra que não tem nostalgia da Bossa Nova, destilando mordacidade e acidez, em narrativas de ritmo alucinante, que vão fazer você rir muito. De nervoso. Destaque para Mulher enxugando-se e Rosas vermelhas para Rita Hayworth.

O interessante é que não há nada de pós-moderno em Melillo e Mannarino, pelo contrário: a maior preocupação de ambos parece ser simplesmente a de contar uma história. O que pode parecer simples, mas não é fácil. No entanto, eles tiram isso de letra indo na contramão do que se tenta fazer hoje em literatura aqui no Brasil (com uma incrível legião de imitadores potenciais de Nick "Alta Fidelidade" Hornby, mas que não chegam aos pés do role model), bebendo de forma às vezes camuflada, às vezes quase explícita, na fonte de autores bem mais antigos. Melillo parece se inspirar no Machado de Assis de contos como O Segredo do Bonzo e até mesmo no esquecido Coelho Netto, mas com uma incrível pitada de Luís Fernando Veríssimo. Já Mannarino parece ser fã das comédias brejeiras de Silveira Sampaio ao falar de encontros amorosos às escondidas, como em Meu encontro com Pascale. Mas quem ler o conto vai ver algo muito diferente das situações burlescas de peças como A garçonnière de meu marido.

Se aqui ficou a impressão de que Melillo e Mannarino são copiadores do estilo alheio, mea culpa, porque não é nada disso: Os contos do fim do mundo e Hamlet e Macbeth nasceram em Muriaé têm em comum a forma convencional e o humor como ponto de partida – mas um humor muitas vezes negro e ácido. Comme il faut neste novo século.

Os dois livros passaram quase despercebidos no ano passado, pelo menos no Rio de Janeiro. Não fosse pela disposição de algumas livrarias (respectivamente a Livraria da Travessa e a Argumento, ambas no Rio) e talvez não chegassem até nós. Felizmente chegaram.


Bagaginha literária


Domingo agora tem viagem: conheça o conteúdo de minha fiel escudeira, a bolsa:

. Foundation and Earth, Isaac Asimov – o quinto e último volume das histórias da Fundação. Mais que uma saga literária, ler as histórias de Asimov é uma saga de leitura. Na volta eu explico.

. Inglaterra, Inglaterra, Julian Barnes – Um dos livros mais recentes do autor de O Papagaio de Flaubert. Nada como o humor inglês: os fãs de Nick Hornby agora vão saber em quem ele se inspira.

. Os outros 90%, Robert Cooper – Nem só de lazer vive o homem: este livro é para uma resenha encomendada, mas tem jeito de ser bom. Cooper é autor de Inteligência emocional na empresa. Se recebeu o aval de Daniel Goleman (que é injustamente sacaneado cá por estas plagas), então vale. Confesso que o subtítulo me atrai: como desbloquear seu vasto e não-aproveitado potencial no trabalho e na vida. Quem não quer melhorar de situação?

Qual é a Deles?


Império, de Antonio Negri e Michael Hardt (Record, 501p), uma análise lúcida e abrangente da política contemporânea, que se estende ao modo como ela influencia a vida quotidiana e até molda a maneira como percebemos a realidade.
Lúcio Manfredi, editor do blog O Franco-Atirador.

27.9.01

Berinjela ao cair da tarde


Eu já havia feito um comentário bem no comecinho do Lanceiro Livre, mas não aqui. Para quem mora no Rio de Janeiro, o melhor sebo atualmente é a Berinjela, onde você encontra o que há de melhor em livros usados e CDs idem (mas a parte musical também contém novos e importados).

Minha lista de compras de hoje:

. Hawking e os buracos negros em 90 minutos, de Paul Strathern (Jorge Zahar Editor) - meu passado de estudante de eletrônica me condena: não levo jeito pra técnico ou engenheiro, mas continuo gostando de ciência de modo geral. Einstein e Hawking são meus prediletos entre os mais modernos. Se este livrinho, da famosa série inglesa Cientistas em 90 minutos, for igual aos da série Filósofos em 90 minutos, do mesmo autor e também publicados no Brasil pela Zahar, então estou bem servido, porque são gostosos de ler e incrivelmente divertidos.

. Sob os olhos do ocidente, de Joseph Conrad (Brasiliense) - Conrad dispensa comentários, mas a fonte não: foi graças ao comentário instigante do colega jornalista Guilherme Kujawski que resolvi comprar este livro, que fala dos últimos anos do regime czarista russo. A visão de Conrad, que tende a tornar difusas as barreiras entre bem e mal e tornar (ainda mais) indefinidos os limites da moralidade, é algo que precisamos ler hoje - talvez os americanos mais do que nós, mas esta é outra história.

. Deus - uma biografia, de Jack Miles (Companhia das Letras) - Eu andava atrás deste livro há um bom tempo, e agora meus (poucos, admito) esforços foram recompensados. Segundo Harold Bloom, Miles demonstra admirável compreensão da personalidade infinitamente metamórfica e do imprevisível caráter moral de seu personagem. Realmente, falar de Deus não é fácil. Mas dizem-me que o colega Miles, do Los Angeles Times, fez uma ótima análise de Deus enquanto personagem da Bíblia, algo que até então ninguém tivera realmente coragem de fazer. O chato é que meu exemplar foi muito bem aproveitado pelo dono anterior: veio todo sublinhado - e à caneta!!! Deus, assim fica difícil... ;-)

. Senhor dos mundos subterrâneos - Jung e o século XX, de Colin Wilson (Martins Fontes) - Na crítica ao primeiro volume da correspondência de Jung (scroll down, por favor), eu citava justamente a biografia que Wilson escreveu sobre Wilhelm Reich... e nem desconfiava que ele havia escrito também uma do Carl Gustav: mea culpa, que eu retifico agora. O excelente autor de clássicos como A gaiola de vidro e A criminal history of mankind não brinca em serviço. Em breve, mais sobre este livro.

26.9.01


Livros recebidos: Na liberdade da solidão, de Thomas Merton (Vozes), A mais bela história de Deus - quem é o Deus da Bíblia?, de Jean Bottéro, Marc-Alain Ouaknin e Joseph Moingt, e A intolerância - diversos autores, prefácio de Elie Wiesel (Bertrand). Obrigado a Mirella e a Celeste. Aguardem comentários muito em breve.

25.9.01

Tem pra todos os gostos


Eu falava mais abaixo (vide a Bagaginha Literária, pseudo-seção que se atualizará sempre que eu viajar, o que acontece mais ou menos quinzenalmente) sobre o livro A sociedade global, do Octavio Ianni. Para quem não sabe, este livro é apenas o primeiro de uma trilogia que inclui Teorias da globalização e A era do globalismo. Publicados pela Civilização Brasileira há poucos anos, eles permanecem fundamentais para quem quer entender para onde a globalização está nos levando. Importante também ler outras visões de mundo, como as de Pierre Lévy e Paul Virilio, e aqui vocês verão todas, para todos os gostos: aguardem leituras da trilogia de Ianni e das obras dos dois pensadores franceses.

Falando em pensadores franceses: vocês já leram a entrevista que Jean Baudrillard concedeu ao Globo? Aqui, em breve, uma análise de seu mais recente livro no Brasil, A ilusão vital.

24.9.01

A volta do viajante


Livros after the comeback from Sampa: Foundation and Earth, do onipresente e sempre divertido Asimov, e Os Contos do Fim do Mundo, do Mario Melillo. Aguardem uma crítica do livro do Mario na sexta, e em breve um comentário sobre a saga asimoviana.

A propósito: a intenção do Lanceiro Livros é pelo menos uma crítica nova toda sexta-feira, e dropes diários sobre tudo o que me cair nas mãos e na frente dos óculos (não é pouca coisa, aviso). Ah, e fiquem de olho na coluna da esquerda.